12 de maio de 1902, o dia em que o Brasil parou

Paris, 12 de maio de 1902, o dia em que o Brasil parou! Para toda uma geração mais moderna, este dia foi o 1º de maio de 1994, com a morte do piloto Ayrton Senna, contudo, no início do século XX, o trágico falecimento de um potiguar causou o mesmo – ou maior – espanto entre os brasileiros.

Estamos falando de Augusto Severo de Albuquerque Maranhão (1864 – 1902) morto após acidente a bordo do próprio invento, o balão semirrígido “PAX”, na rua do Maine, em Paris, na França. Mas por que sua morte causou tanta comoção?

Natural de Macaíba, nascido em 11 de janeiro de 1864, saiu adolescente para concluir os estudos em Natal, depois Salvador e, por último, cursar Engenharia no Rio de Janeiro, na Escola Politécnica. Aos 28 anos foi eleito deputado federal, em 1893, ficando no cargo até 1901, um ano antes de embarcar para a França.

Foi diretor de aritmética na Escola Atheneu, atendendo a convite do governador Xavier da Silveira, ainda em 1890, cargo que dividiu com as ocupações políticas, pois era um parlamentar atuante e com uma visão à frente do seu tempo. Entre alguns projeto importantes aprovados na Câmara dos Deputados, destaca-se verbas para: saneamento do Rio de Janeiro, então capital Federal; a assistência à infância desamparada; e auxílio financeiro às experiências de Alberto Santos Dumont.

Como inventor, Augusto Severo já tinha fama local e nacional. Há relatos dele empinando pipa – ou “papagaio” – para entender melhor os efeitos do vento e a aerodinâmica nos objetos. O sonho de controlar o balão, ou melhor, tornar dirigível durou quase vinte anos, o que viria a ser seu maior sonho. Em 1893, já como deputado Federal, colocou em prática a construção do projeto “Bartolomeu de Gusmão” que era uma balão embrião para o seu maior feito, o PAX.

Dois anos depois, a ideia do balão semirrígido chegou ao conhecimento do marechal Floriano Peixoto, que mandou Severo a Paris com objetivo de construir um protótipo para fins militares para ser utilizado contra revoltosos. (Nota: O mesmo Floriano que nesta época defendia a monarquia, atuaria  na proclamação da República, em 1889).

As invenções desse ilustre potiguar ultrapassam os conhecimentos sobre a dirigibilidade dos balões ou da aeronáutica. Um bom exemplo, apesar de pouco registro oficial ou documento de patente, é o “turbo motor”. O relato é que Severo observando o avanço da tecnologia a vapor, pensou em uma tecnologia diferente de aproveitamento da energia, melhorando o desempenho das máquinas, o que ele comprovou com alguns experimentos.

Não há provas de que ele tenha colocado a ideia em prática, mas de fato, em 1894, a Marinha Inglesa instalou um equipamento similar em um torpedeiros, batizado por “Turbina” ou “Turbinia“. Seu conhecimento náutico o tornou um especialista na Capital Federal, com seu nome cotado para ser ministro da Marinha, por um tempo. Um dos inventos bem sucedidos do potiguar foi o balão Potiguarânia, desenvolvido em 1889, com simetria semelhante ao seu balão dirigível mais famoso, aperfeiçoando a dirigibilidades dos aparelhos mais pesados que o ar.

Artigo no jornal A República de 14.05.1902 (Fonte: Biblioteca Nacional)

Em 4 de maio de 1902, Severo revela ter feito um teste exitoso com o balão PAX, o qual permaneceu estático amarrado ao solo. Isso significava que um potiguar, concorrente do famoso Santos Dumont e de outros inúmeros inventores, tinha obtido sucesso na dirigibilidade do voo. O olhar atento do inventor percebeu que os balões convencionais dependiam da direção do vento para seguir viagem e quando os aparelhos receberam motores havia um certo descontrole do cesto em relação ao saco em si, devido a flexibilidade das cordas ou cabos de sustentação.

No teste do dia 4, o motor do aparelho foi levado a 80% da capacidade, ligado a 120 rotações das 150 previstas. No dia 11 de maio, o Ministério da Guerra da França autorizou o voo do PAX, prevendo sua passagem sobre Paris e o campo de Issi-Les-Moulineaux, onde se encontravam acampadas as tropas do Exército francês. No dia seguinte, às 5h, o balão foi retirado do hangar sob as ordens de Severo e orientação do mecânico Georges Sachet, auxiliados pelo inventor Álvaro Pereira Pires, que seria o terceiro tripulante, mas minutos antes de levantar voo, Severo mandou-o descer do balão.

Balão PAX em voo sobre Paris (Foto: Acervo do autor)

O Pax levantou voo e por dez minutos realizou manobras antes de se dirigir à Issi-Les-Moulineaux, onde lançaria sobre as tropas do Exército panfletos com os dizeres “O Brasil saúda a França de bordo do dirigível Pax”. Contudo, subitamente quando o balão atingia 400 metros de altura, uma explosão envolveu a estrutura que caiu sob chamas, tendo como testemunha centenas de curiosos. Todos que estavam no aparelho voador morreram.

Foto do acidente na rua do Maine, em Paris (Foto: Acervo do autor)

A notícia caiu como uma bomba  sobre os brasileiros, que esperavam ansiosos por uma boa notícia, que colocaria o aeronauta nos anais da tecnologia e da história. A prova disso foi a comoção de todas as partes do mundo que chegaram manifestada em telégrafos, a exemplo do presidente da França, Emilio Loubet. Por causa do fuso horários, os veículos de imprensa noticiaram tudo ainda no dia 12 de maio de 1902.

O presidente da República, Campos Salles, determinou a suspensão das aulas nas escolas, bandeiras a meio mastro em sinal de luto e notas de pesar em todos os jornais cariocas. Ele envia telégrafo para o ministro do Brasil em Paris, Pisa e Almeida para tomar todas as providência, desde o recolhimento do corpo ao envio ao Brasil.

Recorte do Jornal A República de 14 de maio de 1902 (Fonte: Biblioteca Nacional)

Ainda no dia 12, a Câmara do Deputados determinou a suspensão os trabalhos e o Senado Federal emitiu nota de pesar. Em Natal, a consternação não podia ser pior, principalmente, porque Severo era de família importante, tendo como irmão o senador Pedro Velho e o governador Alberto Maranhão.

As homenagens se seguiram com o passar dos dias e anos. Santos Dumont que presenciou o acidente, chega a enviar carta a viúva de Severo, demonstrando admiração e pesar. Em 1913, foi inaugurada uma placa na rua Du Maine, em Paris, com os dizeres: “Aqui morreram, vítimas da ciência, Severo, – o aeronauta brasileiro e seu mecânico, o francês Sachet. Queda do dirigível PAX, em 12 de maio de 1902”. No dia 12 de maio do mesmo ano, era inaugurada na Ribeira a estátua que permanece até hoje.  Na década de 1930, por mais de uma ocasião da passagem dos dirigíveis alemães, o Zeppelin prestou homenagem ao potiguar, jogando do alto uma coroa de flores em direção a estátua, em passagem pela cidade do Natal. Era o reconhecimento pelo estudo da dirigibilidade dos balões. Já a Força Aérea Brasileira (FAB) reconhece Augusto Severo como mártir da Ciência Aeronáutica e mantém uma de suas aeronaves com seu nome a serviço do Grupo de Transporte Especial (GTE).

Esse artigo teve como fonte de pesquisa jornais A República, em especial um artigo publicado em 14 de maio de 1902.

Em 2024, Augusto Severo finalmente encontrou seu repouso, na cidade de Macaíba, a 20 quilêmetro de Natal, justamente quando lembramos os 124 anos de sua morte. Na última sexta-feira, 10 de maio, os restos mortais de Severo passaram a compor o acervo de exposições do Solar Ferreiro Torto, em Macaíba, junto da lápide original que foi trazida junto do cemitério São João, no Rio de Janeiro, onde estava os restos mortais, originalmente. O esforço em trazer os restos mortais contou com a ajuda de diversos órgãos e entidades, como o Governo do Estado, Prefeitura de Macaíba, OAB, Fecomércio do RJ e RN, entre outros.

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