Há 80 anos se desenrolava um dos maiores mistérios envolvendo aviação, segunda guerra e o Rio Grande do Norte, com o acidente envolvendo um Dakota que iria ser entregue aos ingleses no front e caiu nos arredores de Assu, num trecho entre Fortaleza/CE e Natal/RN.
No dia 15 de abril de 1944, aconteceu o terrível acidente do Dakota III (Serial Number “KG508”), na mesorregião do Vale do Açu, mais precisamente na comunidade do Serrote do Cuó. A aeronave de fabricação norte-americana era similar ao Douglas DC-3 e estava a caminho do teatro de guerra do CBI (China, Burma e Índia), passando por Natal, antes de cruzar o Atlântico, a serviço da Royal Air Force – RAF (Força Aérea Real Britânica), integrando a 113 South Atlantic Wing (RAF).
O percurso de traslado do avião era denominado por “ferry” e muito comum, pois sabe-se que por Parnamirim Field, em Natal, passaram inúmeros aviões para os ingleses, pela RAF Transport Command´s Ocean Ferry, que transportou Dakotas (DC-3), Liberators (B-24), Catalinas (PBY-5), Baltimores (A-30), Fortalezas Voadoras (B-17), Venturas (PV-1), entre outros. Até aviões para os russos os americanos venderam e utilizaram Natal como rota, inclusive, um lote inteiro de A-30 “Baltimores” que seria entregue à RAF teve que ser desviado com urgência aos russos.
As aeronaves partiam das fábricas nos Estados Unidos e o Ferry Command entregava nas bases ou, diretamente, nos locais de combate. Em Natal, na base de Parnamirim Field existia um posto da RAF, comandado por um canadense já que a Royal Canadian Air Force fazia parte do Commonwealth britânico. Este posto de”ferry” estava esperando a passagem do Dakota III KG508, o que não aconteceu. A aeronave havia feito a rota pelo norte do Brasil passando por Fortaleza, no Ceará, à tarde, fazendo contato com a estação radiográfica. Sob neblina e chuva, perto das15h, acontece o acidente vitimando os três tripulantes.
Tripulação:
Piloto, sargento Ronald Jack Uden (1603568)
Navegador, pilot officer Gwilym Deiniol Morris (153759)
Sargento da Royal Australian Air Force, William John Poling (417667)
Testemunhas contam que chegaram a ver o avião passando pela região, que apesar de possuir algumas montanhas, nenhuma chama atenção pela altura, com exceção do Pico do Cabugi, que fica cerca de 600 metros do nível do mar, portanto, não é um obstáculo tão grande, tendo em vista que esta aeronave poderia passar perto do Himalaia, no roteiro do CBI. Como causa do acidente, acredita-se ter sido alguma falha mecânica, associado a desorientação do piloto. Esse é um dos mistérios evolvendo esse acidente, pois seria um voo tranquilo.
O local da queda
Conta a história, que em 1945 a população ergueu um cruzeiro no exato local da queda para celebrar a missa de um ano da morte dos militares e chegou a ser ponto de peregrinação com o tempo. O cruzeiro realmente existe e serve de referência para quem visita a localidade nos dias atuais.
Trata-se de uma região de vegetação predominante da Caatinga, a 25 km do centro de Assu, na região também conhecida como Serrote do Cuó. Interessante citar que na época, já no dia seguinte chegou a primeira equipe americana oriunda da Base Aérea de Parnamirim, que permaneceu por quase uma semana recolhendo os destroços. Os restos mortais dos tripulantes foram levados, inicialmente para Assu, e depois para Mossoró, para depois serem encaminhados a Natal, onde estão sepultados no Cemitério do Alecrim.
Em 2018, acompanhando a gravação do programa Conversando com Augusto Maranhão, fizemos uma expedição ao local da queda, levando inclusive o adido inglês no Brasil, Kevin Flemming e o pesquisador e escritor Carlos Motta. Esta foi a segunda vez que fomos ao local, mostrando as dificuldades que era de se chegar, mesmo com carros 4×4, celulares modernos e GPS, o que nos leva a imaginar que eles enfrentaram em 1944. Em 2010, estávamos acompanhados do coronel da reserva da FAB, Rômulo Figueiredo, escritor e pesquisador da aviação, quem nos apresentou o tema pela primeira vez.
O coronel Rômulo era um pesquisador de grande conhecimento e à época foi discutido outro mistério, quando analisamos a lápide do navegador, Gwilym Deiniol Morris, onde consta um dialeto tido como “desconhecido”. Na verdade, era uma passagem bíblica, encontrada em Mateus, capítulo 5 e versículo 8. A escrita incomum se deu porque um dos tripulantes era de origem galesa, então, em uma das lápides está escrito na língua celta: GWYN EU BYD Y RHAI PUR O GALON; CANYS HWY A WELANT DDUW. (Tradução: bem aventurados os puros de coração, pois deles serão o reino dos céus).
Nota do Blog: O sargento William John Poling (417667) está no Roll of Honour da Royal Australian Air Force
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